BRASÍLIA – O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro aponta
indícios da existência de uma “organização criminosa” no gabinete do
então deputado estadual
Flávio Bolsonaro
(PSL-RJ), atual senador e filho do presidente, para desviar recursos
públicos e descreve detalhes de movimentações financeiras suspeitas
envolvendo Flávio e assessores parlamentares desde o ano de 2007. O
material, com 87 páginas, foi apresentado à Justiça do Rio para pedir as
quebras de sigilo bancário e fiscal de Flávio Bolsonaro e outras 94
pessoas, sob suspeita dos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e
organização criminosa.
“Na presente investigação, pelos elementos de provas colhidos já é
possível vislumbrar indícios da existência de uma organização criminosa
com alto grau de permanência e estabilidade, formada desde o ano de 2007
por dezenas de integrantes do gabinete do ex-deputado estadual Flávio
Nantes Bolsonaro e outros assessores nomeados pelo parlamentar para
outros cargos na Alerj, destinada à prática de crimes de peculato, cuja
pena máxima supera quatro anos”, descreve o MP.
Esse esquema criminoso para desviar salários dos assessores teria
como um dos integrantes o ex-assessor Fabrício Queiroz, cuja
movimentação financeira atípica havia sido detectada pelo Coaf. Para o
MP, “não parece crível” que Queiroz seria o líder da organização
criminosa sem conhecimento de seus “superiores hierárquicos durante
tantos anos”.
Os promotores argumentam, para justificar o pedido, que os dados de
movimentações bancárias suspeitas obtidos pelo Coaf “representam apenas
amostras das movimentações bancárias suspeitas em período de tempo
diminuto, somente o afastamento dos sigilos bancário e fiscal dos
investigados, dos suspeitos de realizarem transações imobiliárias
atípicas com os investigados e de todos os assessores da Alerj nomeados
pelo ex-deputado estadual Flávio Nantes Bolsonaro (...) desde 2007, data
de ingresso de Fabrício Queiroz na Alerj, até o dia 17 de dezembro de
2018, permitirão desvendar os mecanismos utilizados para branquear os
valores da origem ilícita, quantificar o volume de recursos desviados
dos cofres públicos pelo esquema das ‘rachadinhas’ e identificar todos
os coautores e partícipes do crime”.
Ainda para fundamentar as quebras de sigilo, os promotores também
destacam que é difícil obter prova testemunhal em crimes do colarinho
branco devido à possibilidade de intimidação das testemunhas e que, por
isso, a melhor maneira de investigar é ter acesso às movimentações
financeiras.
Além do nome de ‘rachadinha’, a prática criminosa de desvio da
remuneração dos assessores é citada pelo MP com outros dois apelidos:
“rachid” ou “esquema dos gafanhotos”.
A organização criminosa montada no gabinete de Flávio Bolsonaro teria
“clara divisão de tarefas entre núcleos hierarquicamente
compartimentados”. O primeiro núcleo, segundo o MP, tinha a tarefa de
nomear pessoas para ocupar cargos em comissão na Alerj em troca do
repasse de parte dos seus salários. O segundo tinha a função de
“recolher e distribuir os recursos públicos desviados do orçamento da
Alerj cuja destinação original deveria ser a remuneração dos cargos”. O
terceiro núcleo criminoso seria formado pelos assessores que concordaram
em ser nomeados sob compromisso de repassar mensalmente parte de seus
salários aos demais integrantes da organização criminosa.
De acordo com a investigação conduzida até agora pelo MP, há indícios de
que parte desses funcionários eram “fantasmas” nomeados apenas para o
desvio de recursos e tinham inclusive outros empregos remunerados.
Segundo a peça, os assessores deveriam ter dedicação exclusiva e jornada
de trabalho de 40 horas.
Fabrício Queiroz
Em sua análise das provas colhidas até agora, o MP afirma que o
ex-assessor Fabrício Queiroz prestou esclarecimentos com o “nítido
objetivo de tentar assumir sozinho a responsabilidade penal e desviar o
foco da investigação que também recai sobre o ex-deputado estadual que
nomeou os assessores envolvidos no esquema criminoso”.
Para os promotores, as informações prestadas por Queiroz não foram
acompanhadas por provas “e pecam por diversas fragilidades e
contradições”.
No seu depoimento, Queiroz havia dito que se apropriava de parte dos
salários dos assessores de Flávio Bolsonaro com o objetivo de contratar
informalmente outros assessores para prestar serviços ao mandato.
“A defesa (de Queiroz) nem sequer indicou os nomes desses supostos
‘assessores externos’ ou apresentou a contabilidade de tais pagamentos”,
diz o MP.
Já Flávio Bolsonaro apresentou uma manifestação ao MP no dia 19 de
março, por meio de seus advogados, na qual negou ter recebido recursos
de seus assessores, queixou-se do vazamento de informações da
investigação e do acesso aos seus dados bancários pelo Coaf.
Outro lado
Flavio Bolsonaro afirmou, por meio de nota, que "tudo será provado"
dentro do processo. "Tenho meu passado limpo e jamais cometi qualquer
irregularidade em minha vida. Tudo será provado em momento oportuno
dentro do processo legal. Apenas lamento que algumas autoridades do Rio
continuem a vazar ilegalmente à imprensa informações sigilosas
querendo conduzir o tema publicamente pela imprensa e não dentro dos
autos", diz a nota.
OGLOBO
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