A deputada federal Flordelis dos Santos Souza
(PSD-RJ) foi cassada por 437 votos a sete no plenário da Câmara dos
Deputados no começo da tarde desta quarta-feira, 11. Houve, ainda, 12
abstenções entre os 456 presentes na sessão. O relatório do Conselho de
Ética, que pedia o afastamento da parlamentar por quebra de decoro,
precisava ter a maioria absoluta entre os 513 deputados. Desta forma, a
congressista perdeu o mandato, os direitos políticos e, também, sua
imunidade parlamentar. Ela é ré apontada pela Polícia Civil e pelo Ministério Público do Rio de Janeiro como a mandante do assassinato do próprio marido, o pastor Anderson do Carmo, em 16 de junho de 2019 na casa de ambos em Niterói, região metropolitana da capital fluminense.
A ministra Carmen Lúcia,
do Supremo Tribunal Federal, negou o mandado de segurança que tentava
impedir a sessão – último recurso de Flordelis na tentativa de salvar a
sua primeira legislatura. Com a cassação de Flordelis, quem assume é o
suplente – no caso, o vereador da Câmara do Rio Jones Moura (PSD).
“Saio de cabeça erguida, porque sei que
sou inocente. E todos saberão que sou inocente. Vocês não têm todos os
elementos para pedir minha cassação, então me ajudem. Sejam justos e não
me cassem”, implorou a evangélica ao discursar antes do relatório ir a
plenário. Os deputados, entretanto, não se apiedaram diante da súplica.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) chegou a abrir a oportunidade de uma terceira via que poderia salvar o mandato
de Flordelis, e autorizou a proposição de emendas ao rito – contanto
que cada emenda tivesse assinatura de, no mínimo, 103 parlamentares. A
medida abriu caminho para que se aplicasse uma pena mais branda para a
deputada, como uma suspensão temporária do mandato até o resultado do
Tribunal do Júri no qual ela é ré, a exemplo do que houve com o deputado
Daniel Silveira (PSL-RJ). No entanto, nenhum legislador apresentou propostas.
Tanto à Justiça do Rio quanto à Câmara Federal, a deputada evangélica alega não ter sido a mandante da morte do marido.
Seis dos seus 55 filhos – quatro deles biológicos e 51 adotivos – estão
presos acusados de participação no complô que levou ao assassinato do
pastor na garagem de casa.
Ele levou seis tiros e teve seu corpo crivado com 30 perfurações
(de entradas e reeentradas das balas), parte delas na região genital.
Em sua primeira versão, a família alegou ter sido vítima de latrocínio.
Dias depois, Flávio dos Santos,
39, filho biológico de Flordelis, confessou ter atirado em Anderson do
Carmo. A arma, uma pistola calibre 9mm encontrada em cima de um armário
de Flávio, teria sido adquirida pelo filho adotivo Lucas Cezar dos Santos, 19. Em agosto do ano passado, a polícia do Rio concluiu o inquérito e apontou Flordelis como mandante da morte do próprio marido. À época, sua prisão não foi decretada devido à imunidade parlamentar.
Concluído em junho, o parecer do
Conselho de Ética da Câmara apontou que Flordelis usou o mandato para
coação de testemunhas e obstruir as investigações, além de ter mentido
para o Conselho sobre o homicídio. De acordo com o relatório, somente a
matriarca do clã teria dinheiro para aquisição da arma do crime, cujo
valor pago foi 8 500 reais em uma favela carioca. “Apesar das medidas
desesperadas e da má-fé utilizada da defesa em distorcer os fatos e
distorcer a realidade, contando com a ignorância dos deputados, ainda
assim essa relatoria conduziu o processo com isenção contra a deputada
Flordelis”, disse o relator Alexandre Leite (DEM-SP), logo antes da
votação. Ele lembrou que a produção parlamentar da deputada caiu para
“quase zero” após o assassinato de Anderson do Carmo – que, por sua vez,
era conhecido como deputado “nº 514″ nos corredores da Câmara devido à atuação no gabinete da mulher.
O processo de quebra de decoro
parlamentar na Câmara ficou parado devido à pandemia do coronavírus – as
comissões foram dissolvidas durante o ano passado e retomadas em março
deste ano, quando a ação contra a deputada no Conselho de Ética começou a
tramitar, e foi concluída em junho. Desde a morte do marido, a cantora
gospel viu seu império neopentecostal desmoronar. Como VEJA mostrou em fevereiro,
dos seis templos em funcionamento – havia mais um em construção à época
do assassinato de Anderson do Carmo -, restou apenas um em São Gonçalo,
na região metropolitana do Rio. A parlamentar vinha tentando colar sua
imagem a figuras políticas proeminentes da situação, como o presidente
da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e a primeira-dama Michelle Bolsonaro.
VEJA